A expressão “deísmo moralista terapêutico” foi criada pelo sociólogo Christian
Smith para designar a compreensão de Deus nutrida pelos jovens
norte-americanos. Ele pesquisou durante cinco anos a visão religiosa dos
adolescentes dos Estados Unidos, e publicou suas conclusões no livro Soul
searching: the religious and spirituals lives of american teenagers (Oxford
University Press). Ele mostra como esta visão está distante do ensino bíblico.
Algumas de suas conclusões estão em português, nos livros Cristianismo sem
Cristo – o evangelho alternativo da igreja atual, de Michael Horton (Editora
Cultura Cristã) e Deuses falsos, de Timothy Keller (Thomas Nelson).
Examinando-as, o leitor verificará que em nada diferem dos adolescentes
brasileiros, nem dos crentes em geral. Lendo estas obras constatei que o credo
evangélico brasileiro é, sem sombras de dúvida, o deísmo moralista terapêutico.
O deísmo moralismo terapêutico pode ser definido como “Uma crença em que Deus
abençoa e leva para o céu as pessoas boas e sinceras que tentam viver uma vida
decente aqui na terra (o moralismo). A coisa mais importante da vida é se
sentir bem, estar em paz consigo mesmo, e ser feliz (o terapêutico). Deus não
precisa estar envolvido em nossa vida, ou seja, não é um Deus pessoal. A não
ser nos momentos de aperto, quando ele se aproxima e nos socorre (o deísmo)”.
Horton fez uma boa descrição dos seus pontos:
1. Deus criou o mundo.
2. Deus quer que sejamos bons, educados e justos uns com os outros, como
todas as religiões ensinam.
3. O objetivo central da vida é estar em paz consigo mesmo.
4. Deus não precisa estar envolvido com ninguém, exceto quando a situação
for muito aflitiva.
5. Todas as pessoas boas vão para o céu.
Sintetizando:
Deus é uma força criadora, uma energia. Devemos ser bons. A felicidade é o bem
supremo da vida. Não precisamos procurar por Deus, a não ser quando a coisa
fica feia. E a salvação é universal. É uma religião humanista em que o
Transcendente não é tão relevante assim. O fiel olha para baixo, ao invés de
olhar para cima. Olha para dentro, ao invés de olhar para fora. A preocupação é
consigo mesmo, e não com o mundo. A ética é calcada sobre si, pois a decência
na vida é para se sentir bem, em paz, não por amor ao próximo ou como um ato de
culto a Deus. É uma barganha, nada mais.
Isto não é exclusivo dos jovens americanos ou brasileiros. Parece ser a
pregação nas igrejas evangélicas, que baniram o pecado, a necessidade de
expiação, a morte vicária de Cristo e a condenação para os que o rejeitam. E onde
o Transcendente é apenas uma Força que pode ser manipulada em benefício do
fiel. Num mundo egoísta, em que as pessoas querem apenas satisfazer suas
carências e vêem Deus como o grande quebrador de galhos, que vai enriquecê-las
e resolver todos os seus problemas, esta mensagem encontra grande aceitação.
Deus existe para seu benefício e satisfação pessoal. Há igrejas que estão há
anos sem ouvir um sermão sobre a obra vicária de Cristo, a chamada ao
arrependimento e abandono do pecado.
A mensagem é esta: você tem direitos, deve exigi-los, e se souber
exigir segundo aquela igreja ensina, será abençoado. Mesmo que viva em pecado.
Aliás, pecado caiu em desuso. O único pecado é a falta de amor. Um livro bem
interessante sobre este tema é de um teólogo católico, Moser: O pecado ainda
existe? (Edições Paulinas). Parece que não. Existe apenas a necessidade dos
clientes a serem satisfeitos na igreja.
A pregação de hoje parece mais focada na terapia (como Deus pode tornar
alguém feliz) do que nas propostas de Deus. As necessidades do cliente são
mais fortes que a proclamação da santidade de Deus. Oferece-se graça
(geralmente ligada à saúde, bens materiais e resolução de conflitos
familiares), mas omite-se a santidade de Deus. Quando você ouviu (ou pregou)
pela última vez, um sermão falando da santidade de Deus e do pecado humano?
Há pregadores mais interessados em fidelizar clientes, dizendo-lhes o que
querem ouvir do que proclamar os atos de Deus em Cristo, dizendo o que Deus
quer ouvir. Prova disso são as faixas de campanhas de igreja, que relaciono a
seguir (faixas reais, que vi): “Venha buscar sua bênção!”, “Uma bênção a
cada culto!”, “Nós temos uma bênção para você!”, “Você nasceu para vencer!”,
“Aprenda a vencer o Devorador”, “Venha recuperar o que é seu”, “Aqui, a bênção
é maior!”. E, por incrível que pareça, esta (não vi, mas me disseram):
“Aqui, o seu dízimo é apenas 7%” (e há gente pedindo 30%!).
Há pregadores que colocam o foco em si. Sua mensagem glorifica seu ministério.
Antigamente os crentes oravam dizendo: “Esconde teu servo atrás da cruz de
Cristo”. Hoje há quem esconda a cruz de Cristo atrás de si. Como disse um
membro de igreja: “O tema predileto de nosso pastor é ele mesmo”. Com este tipo
de pregação personalista, massageadora do ego, lisonjeira ao pecador, não é se
de admirar que o deísmo moralista terapêutico esteja em expansão. É o credo
oculto de muitas igrejas. Mas bem explícito nas pregações.
Preocupa-me ver que as igrejas hoje estejam caminhando para o ecologismo, num
discurso politicamente correto, mais interessadas em mostrar sintonia com os
novos tempos, do que se prender aos velhos tempos. Igreja tem função mais
importante que falar de ecologia e ensinar coleta seletiva de lixo.
Ela é pregoeira dos atos de Deus em Cristo. Ela deve dizer como Paulo:
“Porquanto decidi nada saber entre vós, a não ser Jesus Cristo, e este
crucificado“ (1Co 2.2). Sua missão é mais ampla e mais profunda que dizer aos
homens que devem ser bons e amigáveis. Ela deve dizer: “Assim, vos suplicamos
em nome de Cristo que vos reconcilieis com Deus” (2Co 5.20).
A igreja deve pregar o evangelho e pregar o evangelho não é fazer saraus
musicais ou shows gospéis. É dizer que o homem é pecador, que necessita se
arrepender de seus pecados e crer em Jesus Cristo, que ele voltará em poder e
glória e julgará o mundo. No deísmo moralista terapêutico, nossa função é
apenas cuidar do mundo que a Força Cósmica produziu.
O deísmo moralista terapêutico tem avançado porque igrejas e pregadores têm
negligenciado a pregação autêntica. As igrejas não devem se preocupar em serem
“igrejas amigáveis”, mas sim de serem igrejas leais à essência do evangelho. E
esta ainda é a mesma: “... Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as
Escrituras, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, conforme as
Escrituras” (1Co 15.3-4) e “... a trombeta soará... “(1Co 15.52).
Deísmo moralista terapêutico é a perversão do evangelho. É um evangelho humano,
de gente que se serve do evangelho, mas não prega a verdade bíblica. É uma
infelicidade para a igreja porque a enche de pessoas que sequer sabem o que é
seguir a Cristo, mas que se julgam cristãs. Imunizam-se contra o verdadeiro
evangelho. Deus cobrará desses pregadores e dessas igrejas o desvio que
fizeram.
O evangelho que Jesus revelou é “Cristo crucificado, poder de Deus para
salvação de todo aquele que crê. O evangelho do deísmo moralista terapêutico é
a negação de Jesus. É anátema. Que seja recusado. Está na hora das igrejas e
dos pregadores voltarem à Bíblia.
Que Deus tenha misericórdia de nós.
Shalon!!!
Nenhum comentário:
Postar um comentário